John Carter: Entre Dois Mundos (John Carter, Estados Unidos, 2012) é baseado na série de livros escrita na década de 1910 por Edgar Rice Burroughs, criador de outro personagem clássico, Tarzan. Na história, John Carter é um veterano da Guerra Civil que, depois de uma tragédia familiar, cansou-se de ter uma causa por que lutar. Em busca de ouro, acaba sendo transportado para Marte, onde é capturado por uma tribo de habitantes locais (de seis membros, uma abundância que se estende também a toda a fauna), e logo se vê em meio a uma violenta disputa pelo domínio do planeta. Embora seja reverenciado por ter a habilidade de dar grandes saltos (algo que a diferença de gravidade propiciou, explica um personagem em certo momento), Carter não quer tomar parte nessa guerra; mas talvez ele reveja essa decisão, porque não esconde um afeto pela princesa Dejah Thoris, cuja liberdade está em jogo. A direção é de Andrew Stanton, que sempre foi fã das histórias de Burroughs e aqui realiza sua primeira incursão no Cinema live-action — seus trabalhos anteriores incluem duas das melhores animações da Pixar, Procurando Nemo e Wall-E. Ao mesmo tempo em que queria manter a sensação de deslumbre que os livros proporcionavam, Stanton sabia que algumas modificações precisavam ser feitas, e quis dar a seus personagens uma densidade que muitas vezes é esquecida em produções cercadas de tanto dinheiro. O resultado funciona, e não poucas vezes o filme alcança grandes momentos. Mas para isso se gasta muito tempo, e a sensação é de que sobra trama. O 3D foi convertido em pós-produção por estratégia do estúdio, e não é dos mais elogiáveis — o diretor inclusive declarou no Twitter que, na oportunidade de se ver em cópia convencional, isso seria uma ótima escolha.
Reis e Ratos (Brasil, 2012) se concentra no período logo antes do golpe de Estado que instalou a Ditadura Militar no Brasil, e se pretende comédia ao acompanhar o envolvimento desastroso de agentes americanos com oficiais brasileiros nas tentativas de tirar o então presidente do poder. Durante a Guerra Fria, é sabido, as lideranças capitalistas e socialistas usavam-se de táticas de influência (em vez do embate direto entre si) para trazer governos para seu lado. Nesse período, temendo que o Brasil sucumbisse ao socialismo nas mãos de João Goulart, os Estados Unidos apoiaram a tomada de poder pelos militares. Ficasse a narrativa apenas numa despretensiosa comédia de erros sobre esses eventos, talvez a recepção fosse mais amena. Mas o filme quer moralizar para um lado cafona e clichê que, em face dos eventos reais, chega a ser repugnante. Para tanto, o diretor Mauro Lima (de
Meu Nome Não É Johnny) apela especialmente para uma narração em
off que faz nada além de repetir em palavras o que está acontecendo na tela, enquanto introduz sua suposta protagonista, para quem tudo não passou de uma "história de amor". Nos momentos em que se desvencilha de tamanha desfaçatez, dá até para rir com Selton Mello e Rodrigo Santoro em caracterizações excelentes (e absurdamente exageradas, como é para ser), e apreciar o trabalho realizado na trilha sonora, que imprime o clima retrô esperado.
Em
Tão Forte e Tão Perto (
Extremely Loud and Incredibly Close, Estados Unidos, 2012), o diretor Stephen Daldry mais uma vez usa o elemento social para delinear o drama de seu protagonista. Como Billy Elliot, que tinha de enfrentar as barreiras e preconceitos estabelecidos na sociedade (e preservados mais fortes na sua própria casa) para fazer balé; como Virginia Woolf, Laura Brown e Clarissa Vaughan, que não se encaixavam em seu próprio tempo, mas não aceitavam a resignação de viver sob as convenções; e como Michael Berg, cujo temor se confundia com o sentimento generalizado de culpa que assolava a sociedade alemã, agora é Oskar Schell quem precisará lidar com suas limitações para decifrar o que considera um último desafio deixado pelo pai, morto nos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001. Schell, ele próprio explica em certo momento, talvez tenha a síndrome de Asperger, condição que suprime as habilidades de socialização da pessoa e sua capacidade de compreender as emoções dos outros. Seu pai lhe era bastante próximo, e criava complexos jogos e enigmas que exigiam de Oskar ir às ruas e se aproximar de outras pessoas para resolvê-los. A perda acaba deixando espaço para atritos com a mãe, com quem a relação é distante, mas o garoto logo se vê diante de um novo mistério: o que significa a chave que encontra dentro do armário de seu pai, junto a um envelope com um nome? Na abertura de sua crítica sobre o filme, o crítico americano Roger Ebert escreveu que nenhuma obra sobre o Holocausto conseguira criar uma catarse no público, e que possivelmente o mesmo valia para o 11 de setembro: tais assuntos sobrelevam a Arte. Seu texto não era dos mais favoráveis, atribuindo a
Tão Forte e Tão Perto uma abordagem simplista e cheia de artifícios (opinião de que muitos compartilham), mas sua introdução não revela um sentido necessariamente negativo. Daldry parece querer que, assim como para o protagonista, as resoluções sejam graduais ao espectador, e a emoção acompanhe esse desenvolvimento. Em meio a um primor técnico — a montagem, a fotografia e a música criam uma harmonia deslumbrante —, há um grupo de intérpretes em momentos brilhantes: Thomas Horn, como Oskar, é uma revelação; Sandra Bullock, como a mãe, está numa de suas melhores atuações; Tom Hanks, o pai, não precisa de muito tempo para passar confiança, leveza e determinação; e Max von Sydow, o veterano ator sueco que aqui interpreta um senhor que ajuda Oskar em sua busca, diz tudo sem dizer nada. Filme belíssimo.