Não há nada de original em 'Invocação do Mal' ('The Conjuring', 2013) que justifique o impressionante buzz do filme entre crítica e público. O que existe, no entanto, é algo cada vez mais raro no cinema de horror contemporâneo: paciência para desenvolver a trama, sem atropelos ou excesso de sustos fáceis - o que contribui para a construção de uma atmosfera de terror setentista envolvente, com clima e referências que emulam com naturalidade alguns clássicos do gênero. Assim, é lamentável que o roteiro recorra a algumas soluções extremamente frouxas para amarrar suas pontas - o que não tira os méritos do filme no geral, mas deixa uma sensação de experiência incompleta.
Dirigido pelo promissor James Wan, do primeiro 'Jogos Mortais' e do interessante 'Sobrenatural', o longa apresenta em seus primeiros minutos o casal de demonologistas Ed e Lorraine Warren, conhecidos pelo grande número de casos sobrenaturais desvendados nas décadas de 60 e 70 (inclusive o célebre episódio em que foi baseado 'Terror em Amityville', de 1979). Simultaneamente, acompanhamos a mudança da simpática família Perron para sua nova casa, e não demora muito até os moradores notarem que há algo de errado com o local - sim, todos os clichês estão lá: do cão que late para o nada aos relógios que param sempre no mesmo horário. Felizmente, Wan já é um cineasta com alguma bagagem no gênero e não força a barra nesses lugares-comuns.
Um dos acertos da produção é não manter-se presa a um único subgênero do terror. Embora inicie como um clássico filme de casa mal assombrada, ele passeia com fluidez por outros nichos, como bruxaria e possessão demoníaca, além de beber de fontes bastante conhecidas - 'O Exorcista', 'O Bebê de Rosemary' e 'Poltergeist - O Fenômeno' são as mais evidentes. Ainda assim, a história caminha (e bem) graças às próprias pernas e às invencionices visuais de seu diretor, que possui 1) timing exemplar para as sequências de suspense; 2) noção de posicionamento e movimentos de câmera, importantes para ajudar o espectador a conhecer (e temer) cada canto da casa. Soma-se a isso a pálida fotografia e a sóbria ambientação do final dos anos 60, que dão ao longa um incômodo aspecto funesto.
Mas 'Invocação do Mal' não teria a mesma força sem o ótimo elenco, encabeçado por Vera Farmiga e Patrick Wilson. Ambos conferem ao casal de "caça-fantasmas" um ar de segurança e credibilidade profissional que contrasta com a fragilidade mental da família atormentada. Enquanto isso, Lili Taylor acerta em cheio na composição da mãe que, arrasada física e psicologicamente, vira alvo fácil para os vários espíritos malignos que ali se encontram. Aliás, não é difícil perceber semelhanças entre sua personagem e as mães dos três clássicos citados anteriormente - ainda que, nesse caso, o catalisador das forças do mal seja ela, e não suas filhas.
Após tanto cuidado com o desenrolar da narrativa, os roteiristas Chad e Carey Hayes, talvez já sem ideias, recorrem a um desfecho que destoa do tenso e bem orquestrado clímax. A conclusão para o exorcismo da personagem de Taylor apela a um viés emocional cuja solução parece demasiado fácil, quase artificial. Além disso, há uma pequena trama paralela envolvendo a sinistra boneca Annabelle que, mesmo rendendo bons sustos, não é bem resolvida e poderia facilmente ser limada da edição final. Em um gênero desgastado por uma leva recente de filmes péssimos, 'Invocação do Mal' consegue ultrapassar a média com certa facilidade, ainda que lhe falte uma resolução à altura do conjunto. Quem sabe na continuação... Ou alguém duvida que os Warren não têm outras histórias de arrepiar prontas para ganhar as telas?