Sobre velhos e jovens | Os novos discos de Elton John e Paul McCartney

Dois músicos britânicos, ambos ícones, mestres no que fazem. Dois 'Sirs', reconhecidos não apenas pelo talento, mas pelo comprom…
Dois músicos britânicos, ambos ícones, mestres no que fazem. Dois 'Sirs', reconhecidos não apenas pelo talento, mas pelo comprometimento com causas nobres. Duas lendas que dispensam esse tipo de apresentação, embora possuam currículo de sobra para tal. De um lado, o dínamo de hits da década de 70 e exímio pianista, Elton John. Do outro, um dos garotos de Liverpool, o multifuncional Paul McCartney. Inesgotáveis, eles chegam a momentos semelhantes em suas carreiras, mas sob prismas completamente opostos, como provam seus novos (e excelentes) álbuns.

'The Diving Board' (Elton) e 'New' (Paul) diferem-se já na concepção. Enquanto o primeiro é uma produção enxuta do sempre eficiente T-Bone Burnett, o segundo aposta no tratamento de nomes que já trabalharam com artistas do naipe de Adele, Amy Winehouse e Kings Of Leon. Essas parcerias tornam evidentes o desejo de cada músico no que diz respeito a execução e, sobretudo, no diálogo dessas obras com o público: enquanto Elton John resgata uma sonoridade setentista mais crua, básica, quase "desleixada" (não, isso não é uma crítica), McCartney dá um verniz mais pop (com direito a flertes com o eletro) a sua sempre enérgica veia roqueira.

Aos 66 anos e com 30 discos lançados, Elton John não precisa provar mais nada a ninguém. E, ao que parece, ele também se deu conta disso, já que 'The Diving Board' em instante algum demonstra essa pretensão. Munido de seu lendário piano, e acompanhando apenas por bateria, baixo e uma guitarra aqui e ali, ele defende cada canção com um vigor que imediatamente emula grandes momentos de sua carreira, como em  'Madman Across the Water' (1971) e 'Goodbye Yellow Brick Road' (1973). Repleto de canções elegantes (a parceria com o letrista Bernie Taupin é sempre um trunfo de Elton), o álbum transita com sucesso ente os estilos que forjaram a musicalidade do cantor, como jazz, gospel e blues. Outro acerto de Burnett é dar a obra uma atmosfera descompromissada: alguns solos de piano de Elton soam como improviso, e só comprovam a imensa intimidade do músico com o instrumento.

A própria temática que norteia 'The Diving Board' traz consigo muito desse Elton John que não quer reinventar-se à essa altura do campeonato, mas apenas expor e divertir-se com sua (convenhamos que não é pra tanto) "idade avançada". Letras como a de 'Take This Dirty Water' ("Procure por dias que nunca terminam/ Se é só para ter a chance/ De se sentir como uma criança outra vez") dão o tom de um disco que beira o melancólico sem nunca abraçá-lo por completo. Há sempre um sopro de resignação que se opõe a ideia de conformismo que a velhice carrega: "E eu não posso ficar sozinho esta noite/ Não posso deixar outro dia passar", canta ele em 'Can't Stay Alone Tonight'.


Acertadamente batizado de 'New', o 16º álbum solo de Paul McCartney mostra suas armas já no contagiante riff que abre 'Save Us'. Daí em diante, o 'novo' Paul costura diversas vertentes do pop em um trabalho que, embora não traga uma temática específica, possui uma consistência sonora de dar inveja a qualquer "ícone" pop da nova geração. Sem medo de arriscar, ele vai do folk a música eletrônica com a espontaneidade de quem, aos 71 anos, está pouco ligando para o que os outros vão dizer (característica comum a jovens e velhos, diga-se). Há até espaço para referências aos Wings e aos Beatles - sempre com uma roupagem 'nova', como sugere o título.

Esse grande mosaico pop que é 'New' tem, no entanto, uma sólida base no rock n' roll. Não por acaso, as canções que mais se destacam são, temática e musicalmente, as que apresentam a verve mais marcante de Paul. O singelo conto cotidiano 'On My Way to Work' faz lembrar 'A Day In The Life', clássico do fab four; guitarras pesadas, canções sobre mentes inquietas e garotas também estão lá, completando um pacote de músicas agradavelmente grudentas, como ensina a cartilha do pop - e como o próprio Paul faz desde os tempos do iê-iê-iê.

Dois músicos britânicos, dois ícones, mestres no que fazem. Dois senhores. Um abraça a idade sem pudores e soa autêntico como há tempos não o fazia. O outro não esconde a idade, mas banca o 'novo' e ainda tem fôlego para desbancar os novos. Elton, Paul, o pop ainda depende de vocês, jovens ou velhos.

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